Intervenção de José Pedro Soares na inauguração do MNRL

Jose Pedro Soares URAP inauguracao MNRLIntervenção de José Pedro Soares, coordenador da URAP, na inauguração popular no Museu Nacional da Resistência e Liberdade

Estimados amigos, companheiros, camaradas ex-presos políticos, companheiras, filhos, netos e outros familiares, amigos, democratas e antifascistas que hoje aqui vieram à Fortaleza de Peniche para participar neste ato popular de inauguração do Museu Nacional Resistência e Liberdade (MNRL).


Bem-vindos. Hoje é um dia, para erguermos de novo, os nossos cravos de abril.

Quando não se desiste e, se luta por causas justas como esta, pode demorar tempo, mas a força da razão e da luta acabam por vencer.
Assim aconteceu na Fortaleza de Peniche, com a transformação de uma das mais sinistras cadeias do fascismo, neste moderno Museu Nacional Resistência e Liberdade.


O Museu que hoje e no futuro continuará a representar a tenacidade e a luta contra o medo, a opressão e o arbítrio. Um local de memória e grande símbolo da resistência antifascista dos portugueses.
Há precisamente 50 anos, nas primeiras horas do dia 27 de abril de 1974, vencidas as resistências de Spínola que não queria a libertação de todos os presos políticos, em Peniche tal como em Caxias, a vontade do povo foi mais forte, as portas destas cadeias finalmente abriram-se para, entre aplausos e vivas à liberdade e ao 25 de Abril, saudar a libertação dos presos políticos do fascismo.


Foram inesquecíveis esses dias 25, 26 e 27 de abril. Quando os jovens militares do MFA - Movimento das Forças Armadas e o povo se mobilizavam para avançar com a mais bonita e a mais avançada das Revoluções que Portugal conheceu.
Aqui em Peniche, a multidão foi enchendo todo o espaço frente à Fortaleza e ali permaneceu sem arredar pé, para receber os que aqui dentro, aguardando a sua libertação, afirmavam para que dúvidas não houvesse, ou “saem todos, ou nenhum”.


No Memorial, erguido à entrada, estão gravados os mais de 2500 nomes de antifascistas que por aqui passaram nesses anos terríveis de repressão e maus tratos, alguns camaradas muitos anos das suas vidas.


Lutaram e sonharam com o fim do fascismo, o derrube do regime opressor e o momento em que terminariam as prisões políticas e se alcançaria a liberdade.
Finalmente esse dia chegou e os que aqui estavam atrás das grades foram recebidos pela multidão no seguimento da iniciativa militar e popular vitoriosa no 25 de Abril de 1974.


Os aplausos, vivas à liberdade com que fomos recebidos há 50 anos, foram certamente também para eles, os milhares de camaradas que anos e anos, meses, dias e noites infindáveis que aqui passaram, não desistiram e por essa sua coragem e exemplo se tornaram os elos mais fortes e coerentes que ligaram gerações sucessivas de antifascistas.


Não temos receio em evocar e tornar grande aquilo que na verdade foi maior, mais justo, mais esperado, a liberdade desses dias que nos arrastou para momentos inesquecíveis, dias que o tempo deixou gravado e que hoje aqui, e no futuro, outros continuarão a celebrar porque foi também para o futuro que abril foi realizado.
E não podemos esquecer. Quando o largo frente à Fortaleza se encheu para nos receber, logo se afirmava, que “este local tem que no futuro ser transformado num grande Museu da Resistência”.


Passados 50 anos, aqui estamos, para celebrar a concretização desse apelo, a concretização do direito à memória, para evocar a resistência à opressão, à luta contra a guerra e o colonialismo, pela democracia, pela liberdade, por um mundo mais justo e liberto da exploração, porque foi esse o combate, foram essas as causas porque se bateram os que, entre 1934 e 1974, aqui estiveram encarcerados.


Acontece que já em setembro de 1976, o Governo de então, tinha decidido a criação do Museu da Resistência na Fortaleza de Peniche, embora se tivesse ficado apenas pelo anúncio e nada mais foi feito para a sua concretização.


Passaram-se anos e certa altura, a URAP, e a Câmara Municipal de Peniche, criaram condições para haver espaços visitáveis na Fortaleza.
Iniciou-se também o levantamento dos presos num trabalho realizado pela URAP nos arquivos da Torre do Tombo no seguimento do qual foi sugerido a criação de um Memorial com o nome de todos presos bem a colocação de peça escultórica para os homenagear.


Assim nasceu e foi erguida a obra do escultor de José Aurélio com uma simbologia muito simples, a confrontação do aço com o espelho de água, da luta e da resistência ao regime repressivo, a ânsia da vida e da Liberdade, a que se juntou a expressão de Professor Borges Coelho «Disseram não.. para que a água da vida corresse limpa»


O tempo corria e em setembro de 2016 tudo se precipitava, quando fomos surpreendidos pela comunicação social que o Governo tencionava incluir a Fortaleza de Peniche na lista dos monumentos a concessionar a privados para fins hoteleiros.


Este anúncio foi um choque para os ex-presos políticos, as famílias, os democratas e antifascistas.


Desde logo se desenvolveu o largo movimento de opinião democrática que de imediato contestou essa intenção do Governo dirigindo-se à Assembleia da República com uma petição que recolheu em poucos dias mais de dez mil assinaturas, exigindo uma posição clara desse órgão representativo da democracia, ao mesmo que um conjunto de ex-presos políticos se dirigiam ao Governo exigindo que recuasse nessa sua injusta e descabida intenção.


Foi esse largo movimento de opinião democrática que se manteve nestes anos mobilizado, que venceu dúvidas, impasses, incertezas e fez com que se avançasse e que hoje, aqui nos juntemos, mas desta vez já para celebrar esta vitória do povo, da unidade e da memória.


Por todo este nosso envolvimento, fomos chamados a participar e ajudar a elaborar a proposta e do objeto do que se pretendia. Entretanto avançaram obras, projetos, concursos e em abril de 2017 o Governo aqui reunido decidiu, com base nessas propostas, a criação do Museu Nacional Resistência e Liberdade.

Por isso, é também hoje o dia e o momento para felicitar, todas e todos, os que sonharam, propuseram e não deixaram que a memória do local fosse alterada, esquecida, branqueado o fascismo e os seus crimes.


Lembrar ainda os que nestes seis anos trabalharam nos projetos, nas obras, nas decisões, nos estudos, na elaboração de conteúdos para se erguer o Museu.
Lembramos a Dra. Paula Silva, da Direção Geral do Património Cultural, sua Diretora aquando foi tomada a decisão, o Arquiteto João Barros Matos que concebeu o projeto e o plano das obras do Museu, a Dra. Teresa Albino, técnica superior que acompanhou o processo desde a primeira hora e a Dra. Aida Rechena, Diretora do Museu, cujo empenho, determinação e competência todos lhe reconhecem


Não podendo enumerar todos os que contribuíram para o notável empreendimento, queremos, entretanto, deixar público agradecimento, ao camarada Domingos Abrantes e ao Professor Fernando Rosas, para ambos, o mais elevado apreço pela relevante contribuição no estudo e elaboração de conteúdos para a instalação do Museu Nacional Resistência e Liberdade


Hoje, esta inauguração, representa assim uma importante vitória dos antifascistas portugueses, do povo, e da memória e para continuarmos afirmar:
25 de Abril sempre,
Fascismo nunca mais!

 

27 de Abril de 2024

 

 

 

 

 

 

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