O auditório da Torre do Tombo acolheu, dia 20 de Junho, o lançamento da última edição da União de Resistentes Antifascistas Portugueses (URAP), o livro "Os Presos e as Prisões Políticas em Angra do Heroísmo", que contém uma lista de 645 presos nas cadeias políticas de Angra do Heroísmo, Açores, entre 1933 e 1943.
O livro tinha sido apresentado em Angra do Heroísmo, dia 9 de Maio, integrado na viagem de um grupo de sócios e amigos da URAP às ilhas Terceira e S. Miguel, nos Açores, entre os dias 8 e 12 de Maio, na presença do presidente da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, Álamo de Menezes.
A sessão, à qual assistiram cerca de 50 pessoas, foi presidida por Marília Villaverde Cabral, vice-presidente a Assembleia Geral da URAP, e coube ao escritor Domingos Lobo apresentar a obra.
Para Domingos Lobo, "Os Presos e as Prisões Políticas em Angra do Heroísmo" é “um livro político porque toma partido contra o silêncio, contra as subliminares tentativas de branquear a história do fascismo, nomeadamente o seu lado mais sórdido. Este livro é um poderoso épico, com nomes, rostos, palavras de um povo que se ergueu do chão raso da ignomínia e cantou o dia claro e o direito a respirar livremente na sua própria pátria”.
“Político e Histórico este é o livro que conta a saga daqueles que viveram os tempos duros e sofridos da resistência ao fascismo, nas masmorras políticas da Fortaleza de S. João Baptista e no Castelinho de S. Sebastião, ambos na belíssima cidade de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira. Um livro mais sobre as gerações que viveram a política, a amizade, o companheirismo, o sonho transcendente de um mundo outro, melhor, mais solidário e justo”, afirmou.
O escritor sublinhou ainda que este “é um livro colectivo” que foi “construído com o rigor possível a partir dos documentos existentes na Torre do Tombo, dos arquivos da ex-PIDE/DGS, de testemunhos que foram escritos pelos que estiveram enclausurados nas prisões políticas de Angra, que fazem parte do espólio da URAP”.
Por seu lado, o coordenador da URAP, José Pedro Soares, que saudou a intervenção de Domingos Lobo, descreveu o conteúdo do livro e anunciou a intenção da URAP de insistir junto das autoridades açorianas para que os locais mais emblemáticos do forte sejam assinalados, bem como inscritos os nomes dos presos políticos em memorial.
José Pedro Soares anunciou que a URAP vai lançar brevemente um livro sobre a cadeia de Caxias, na linha de outros trabalhos já publicados pela organização.
Para além de Marília Villaverde Cabral, a mesa era constituída por Domingos Lobo, escritor, poeta, crítico literário, e José Pedro Soares, coordenador nacional da URAP.
A vice-presidente da Assembleia Geral da URAP contou que “este livro tem uma história. Provavelmente, todos os livros têm. Uma história que começa por um documento que nos foi entregue pelo nosso amigo e sócio da URAP, Albano Nunes, que tendo ido participar numa sessão na Universidade de Angra, foi visitar a Fortaleza de S. João Baptista, antiga prisão política, e nos deu a conhecer o que viu. Isto passou-se em 2014”.
“Trocámos ideias na URAP e como já tinha havido uma delegação que visitou e homenageou os antifascistas que tinham estado presos no campo de concentração do Tarrafal e conhecíamos pouco das prisões de Angra do Heroísmo, decidimos contactar a Câmara Municipal e os militares (o forte é da responsabilidade do Exército) e lá fomos, em 2015. Eramos 14 membros da URAP. Inaugurámos, em conjunto com a Câmara, uma lápide que simbolicamente assinala a nossa passagem por aqueles locais para homenagear quem por ali esteve encarcerado, anos das suas vidas”, acrescentou.
Marília Villaverde Cabral disse ainda que “a URAP orgulha-se também de, através de amigos, ter descoberto que, para além do Forte de S. João Baptista, também estiveram presos, antifascistas, num pequeno Forte, a que chamavam Castelinho”.
"Os Presos e as Prisões Políticas em Angra do Heroísmo” relata a história dos dois fortes, desde a sua construção no século XVII, enquanto fortalezas militares, mas também dá exemplos da sua utilização como prisões político militares, como o cativeiro do rei D. Afonso VI, a prisão de Gungunhana ou os prisioneiros alemães durante a I Guerra Mundial.
Aborda a deportação para os Açores e as prisões políticas de Angra durante a Ditadura Militar (1926-1933) e no período do Estado Novo, desde 1933 até à desactivação em 1943, especificando o quotidiano dos prisioneiros políticos, a sua organização comunitária, a repressão. Descreve ainda o Calejão, da Poterna e das Furnas, as tentativas de fuga, os carcereiros, episódios do dia-a-dia, a luta para quebrar o isolamento.
Na lista dos 645 presos, elaborada com base nos arquivos da PIDE/DGS, na Torre do Tombo, no Museu Militar e em tantas outras instituições, com indicação das profissões, naturalidade e data da prisão, há uma referência particular aos presos naturais dos Açores (estão identificados 40) e ainda a duas mulheres, por serem suspeitas de entregarem aos presos correspondência clandestina. Inclui ainda algumas notas biográficas resumidas de presos cuja estada em Angra justifica particular destaque.
O livro apresenta igualmente documentação escrita e constitui, tal como os outros editados pela URAP, um contributo para o estudo dos historiadores sobre a natureza dos presos que estiveram na ilha, mas também sobre as diferentes fases da prisão de Angra - um Depósito de Presos Políticos e Sociais a partir de 1933 até 1936 dirigida por um contingente policial ido do Continente, e depois dessa data dependente do Governo Militar dos Açores (como já tinha acontecido de 1927 a 1933). Também um local onde foram julgados sumariamente alguns presos políticos, por acção do Tribunal Militar Especial, que aí se deslocava para o efeito.